quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Esqueletos nos armários



É comum ouvirmos a cada vez que se tornam públicos escândalos e histórias escabrosas, em países em desenvolvimento, que isso só acontece no “terceiro mundo*”. Pois bem, alguns relatos tornados públicos esta semana, mas de maneira bem tímida, mostram que países tidos como exemplos corriqueiros de desenvolvimento, cidadania e justiça, também tem seus “esqueletos nos armários” e que os mesmos precisam ser retirados para uma ampla limpeza, dos espaços.

A jornalista e documentarista Dorrit Harazim (1943), nascida na Croácia, então parte da Iugoslávia (1918-2003) mas que tem nacionalidade brasileira publicou um texto no Blog do Noblat, falando de um passado não muito recente e absurdamente desumano, da Suíça, o paraíso dos endinheirados, dos chocolates e dos queijos. O relato conta a história dos verdingkinder (algo como crianças arrendadas). O termo é utilizado para se referir a mais de 300 mil crianças pobres, órfãs, ou ainda consideradas “fardos econômicos”, que eram distribuídas pelo Estado para famílias de agricultores, como mão de obra barata- praticamente escravos -.

Essa prática nefasta teve início em meados do século XIX, e perdurou até 1981. Ainda hoje, a sociedade suíça, tenta organizar um referendo sobre a reparação financeira aos sobreviventes dessa prática. Uma petição pedindo o referendo foi lançada em abril deste ano e já alcançou 100 mil assinaturas. Para que o referendo seja realizado, falta apenas a aprovação do parlamento. Entretanto, o Sindicato dos Agricultores (principal categoria beneficiada pela prática) e o Partido Democrata Liberal (de direita), se opõem a iniciativa e já anunciaram que não irão colaborar com o Fundo para atender os sobreviventes. Tal fundo teria o valor de 500 milhões de Francos Suíços (R$ 1,3 bilhão).

Causa estranheza, saber que um país tão invejado, quando se trata de questões como justiça, educação e trabalho, tenha baseado sua formação econômica na prática escravagista, mesmo depois de tantos anos de a escravidão ter sido “oficialmente” abolida.

É urgente que a Suíça acerte as contas com o seu passado e caso tal retificação não seja feita, é preciso que a Comunidade Internacional, puna através de sanções comerciais e econômicas este pequeno país, no coração da Europa, nos mesmos moldes que já fez com tantos outros países pelo mundo.

* Expressão que caiu em desuso desde o fim da Guerra Fria.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Precisamos falar sobre aborto

Não é de hoje que esse assunto alimenta debates acalorados e polêmicos, mas o aborto precisa ser entendido como uma questão de saúde pública e não de segurança. Não vejo razões plausíveis para se alterar a legislação brasileira, quando a questão é o aborto. Não é nela que reside o núcleo do problema que está diretamente ligado a essa prática.

O aborto precisa ser visto como legal nos casos já previstos em lei e nestes casos, a rede pública de saúde, deveria ser estruturada para garantir que as mulheres que se enquadrarem nos casos estabelecidos pela legislação e que queiram abortar, tenham um tratamento digno e seguro, eliminando os riscos que os abortos ilegais envolvem.

Atualmente, o aborto clandestino é a quarta maior causa de morte materna no país e levantamentos recentes apontam que o número de abortos ilegais, já ultrapassa 1 milhão, o que por si só já demonstra a necessidade de abordar a questão de forma mais clara e objetiva.

Essa realidade demonstra que é preciso ampliar e estruturar a rede pública de saúde para atender os casos, permitidos pela legislação. Atualmente existem apenas 65 unidades de saúde aptas para fazer o aborto em todo o país. É preciso ampliar de maneira exponencial essa rede, garantindo não apenas o acesso ao processo do aborto, mas também todo o acompanhamento social e psicológico que esta situação demanda, mais ou menos como já ocorre no nosso vizinho Uruguai.

Para que essas mudanças ocorram, é preciso que a sociedade se mobilize cobrando do poder público, que esses avanços se consolidem. Somente assim, o país poderá mudar de maneira considerável essa triste realidade que vivemos hoje.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

E por falar em seleção

O futebol tem algumas coisas interessantes. Depois de cerca de quatro meses do pior resultado da história da seleção brasileira, a derrota por 1 a 7 diante da Alemanha, em pleno Mineirão, ainda tem muita gente que recorda do resultado para tentar justificar várias coisas ruins do futebol no Brasil. É evidente que o futebol brasileiro não vive um bom momento e isso é visível não apenas com a seleção, mas também é preciso um olhar mais atento para se fazer uma análise global do futebol e da seleção canarinho.

Amanhã, 18, o Brasil fará seu último jogo em 2014. A adversária será a Áustria e a partida será na casa do adversário e o Brasil tenta manter a sequência de vitórias que se iniciou logo após a Copa do Mundo e que conta com vitórias contra a Colômbia, destaque do mundial no Brasil, vitória sobre a Argentina, atual vice campeã mundial.

Por outro lado, equipes que tiveram destaque durante a Copa deste ano, não vem apresentando um bom futebol atualmente. Basta vermos a situação das Eliminatórias da Eurocopa, para perceber isso. A Holanda, que estreou na Copa massacrando a Espanha, na Fonte Nova e fechou a competição com o 3 a 0 sobre o Brasil, que lhe valeu o terceiro lugar, está em terceiro lugar em seu grupo e mesmo vindo de uma vitória em casa por 6 a 0 contra a fraca Letônia, estaria fora da Euro, caso a fase classificatória terminasse hoje, mesmo estando em um grupo relativamente fácil, que tem apenas República Tcheca e Turquia, que poderiam complicar a vida dos holandeses.

Outro exemplo é a Alemanha, tetra campeã do mundo, que venceu a Copa no Brasil com autoridade e que está em uma chave onde a classificação em primeiro lugar seria obrigação. Entretanto, na classificação atual os alemães estão em segundo, três pontos atrás da vizinha Polônia, que nem na Copa chegou.

Dos gigantes europeus, o único que vem cumprindo seu papel da maneira como era esperado, é a Inglaterra. O "English Team", lidera sua chave com seis pontos de diferença para Eslovênia. Suíça e Lituânia. A seleção da terra da Rainha, é a única grande com 100% de aproveitamento e uma das três seleções a atingir tal feito. As demais são a República Tcheca e Eslováquia. Outra seleção que vem desempenhando um bom papel é a Itália, que divide a liderança com a Croácia, perdendo apenas nos critérios de desempate.

O desempenho das seleções que disputaram o mundial deste ano, mostra que a "gangorra do futebol" está bastante atuante e quem estava em alta durante aquela competição, hoje já não vive um momento tão bom assim e que parecia estar em baixa naquela época, vem se recuperando bem, ainda que as marcas do passado ainda estejam a mostra, parecem já bem cicatrizadas.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Carta Aberta aos golpistas

Desde o fim das eleições deste ano, no dia 26 passado, uma parcela da população inconformada com o resultado apresentado pelas urnas, passou a propagar ideias erradas para, a partir dela, manipular a população e assim tentar alcançar seu principal objetivo que é a tomada de poder.

Foram manifestações pedindo impeachment da atual presidenta, reeleita agora para mais quatro anos e também o apelo a uma intervenção militar. Esses comportamentos servem apenas para apontar duas tristes características da sociedade brasileira contemporânea.

A primeira é a incompreensão do real significado da palavra democracia. De origem grega, a palavra significa poder (kratos) do povo (Demo), regime de governo em que todas as decisões importantes na política, são tomadas pelo povo, que elegem através do voto, seus representantes. Em uma democracia, mais vital do que a alternância de poder, tão cobrada durante a eleição, é o respeito à vontade da maioria e no dia 26 de novembro, a maioria dos brasileiros decidiu pela reeleição de Dilma. Qualquer ação contrária a isso é tentativa de golpe.

A outra, é que mesmo após 25 anos de uma democracia que vem se consolidando, boa parte da população ainda se encanta pela serpente do totalitarismo. Ao pedirem por intervenção militar, mostram que além de desrespeitarem a democracia, também tratam com desdém, a Constituição Federal, ao tentar distorcer a Constituição de 1988, para justificar uma nova intervenção militar, exatos 50 anos depois da primeira.

Segundo o artigo 144 da Constituição de 1988, lei ou ordem, são entendidas como sinônimo de segurança pública. E conforme o inciso 2o do artigo 15 da Lei Complementar no 97, de 1999 “a atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.”

Assim sendo, o DNA golpista fica claramente exposto quando as pessoas vão as ruas ou a internet pedir intervenção militar para tentar anular o resultado da última eleição.

sábado, 1 de novembro de 2014

Flertando com o golpismo

Acabaram as eleições e depois de quatro meses de intensos ataques de parte a parte, as urnas apontaram a vitória de Dilma Rousseff (PT), para mais quatro anos de mandato. Com esse resultado, o Partido dos Trabalhadores, completará 16 anos ininterruptos de governo. Durante a campanha, a oposição falou muita besteira e distorceu diversos fatos para tentar, através do voto, chegar a Presidência, fosse com o Eduardo Campos, que foi substituído pela Marina Silva, ou fosse com o senador Aécio Neves.

Tudo era motivo para tentar justificar a mudança, que estes nomes diziam representar. Alegaram que o país caminhava para uma ditadura, uma vez que a democracia pressupõe alternância de poder e o PT, caso vencesse, como venceu chegaria ao seu quarto mandato seguido. Para estes senhores, lembro que a África do Sul, que deu ao mundo a figura imprescindível de Nelson Mandela, que faleceu este ano, nunca foi uma ditadura, mesmo no período de apartheid, contra o qual Mandela foi o maior opositor. 

Lá, o Congresso Nacional Africano (CNA), após eleger Mandela presidente há 20 anos, jamais perdeu uma eleição presidencial e nem por isso o país se tornou uma ditadura e a alternância de poder sempre foi garantida.

Outro exemplo, mais próximo é o Uruguai, onde não há reeleição, mas no final deste mês, os uruguaios devem reconduzir Tabaré Vazquez, da Frente Amplia (FA), para seu segundo mandato. Entre um e outro, haverá o mandato de José Pepe Mujica, também da Frente Amplia (FA), que se encerra ao final deste ano. Nosso pequeno vizinho já não é uma ditadura faz tempos e lá, assim como na África do Sul e também aqui, a democracia é garantida de todas as formas. 

Não bastasse o argumento raso de necessidade de alternância de poder, os opositores se valeram do jogo sujo de distorcer os fatos para tentar que isso lhes favorecessem, mas não aconteceu. Agora insatisfeitos com mais uma derrota eleitoral, o principal partido oposicionista, se mostra oportunista e tenta a última cartada desesperada de pedir à justiça eleitoral, a recontagem dos votos no segundo turno, mesmo sem apresentar dados concretos que justifiquem a iniciativa.

É estranho que exatamente 50 anos depois de os setores mais reacionários da sociedade brasileira, terem solapado a democracia com o golpe civil militar de 1964, que gerou uma ditadura de 21 anos, esse mesmo grupo tente novamente desmontar o Estado Democrático de Direito, com uma iniciativa tão baixa como essa recontagem. Além de demonstrarem claramente que não sabem conviver com a derrota, apontam também para o flerte com o golpismo. 

Em breve, não me surpreenderei caso escute de alguém desse grupo, declarações como a creditada ao ex-ditador Figueiredo (1918-1999), ao ser questionado sobre a candidatura de Leonel Brizola (1922-2004) para a Presidência, nos anos 80, quando teríamos a primeira eleição após a reabertura democrática: "Se o Brizola se candidatar, não ganha, se ganhar, não toma posse, se tomar posse não governa".

Para estes senhores que se dizem democratas é preciso destacar que em uma democracia, a vontade popular é soberana e ela é demonstrada através das urnas, como aconteceu este ano. Assim sendo, não reconhecer o resultado das urnas, só pode ser classificado como uma atitude antidemocrática, para não dizer golpista.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Paradoxo da democracia

Com a proximidade do período eleitoral e o acirramento dos debates políticos, vemos sempre a democracia no centro do debate, mas pouco nos importamos com algo que deveria ser fundamental para o bom funcionamento de qualquer democracia consolidada. Me refiro a quantidade de partidos existentes na nossa república. Atualmente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) temos o registro de 32 partidos e é sabido que em breve o Rede se tornará o trigésimo segundo partido, basta passar alguns poucos meses desta eleição, que o registro negado no ano passado será rapidamente dado para esse grupo, finalmente ter um partido para chamar de seu.

Os partidos no Brasil, tem algumas particularidades interessantes. Faz tempos que ideologia e partido não caminham juntos no país e isso acaba por fazer com que partidos que tenham uma definição política no nome, siga realmente aquela ideologia, outros adotam causas genéricas que acabam criando contradições internas. Outro ponto estranho, está no fato de que a cada processo eleitoral, dissidências de partidos, criem seus próprios partidos. Muitos dos atuais partidos que ai estão são frutos de rachas em outro partido.

É evidente que esta proliferação partidária acaba sendo prejudicial ao processo democrático. Seria mais lógico que os partidos já existentes, se identificassem de maneira a garantir um programa de governo para seguir, o que faria com que muitos destes partidos se unificassem, acabando com as "sub legendas", que funcionam apenas como partido de aluguel e linhas auxiliares dos grandes partidos. Exemplos destes são tão fartos em nosso cenário político que chega a ser desnecessário mencionar exemplos aqui.

Entretanto, a democracia, deve, ou ao menos deveria garantir a pluralidade partidária e é ai que se encontra esse grande paradoxo democrático. Poucos partidos, acabam facilitando que os grandes cominem o cenário, levando a disputa para polarizações que podem ser prejudiciais ao processo democrático. por outro lado, a multiplicação dos partidos acaba por facilitar negociatas estranhas, que no fim servem apenas para garantir o status quo e tudo permanecer como está.

Por essa questão, é que a reforma partidária é algo fundamental e tão necessária para o país como outras reformas como a agrária, a tributária, a urbana e a das comunicações. Porém, tal reforma só será possível através da participação popular e não da classe política, que se baterá para manter o atual sistema, que atende apenas aos interesses destes senhores. E essa mudança só acontecerá, quando se encontrar o equilíbrio entre a pluralidade política/ideológica e a representatividade da sociedade, de modo a neutralizar tal equilíbrio.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Endossando preconceitos

O processo eleitoral deste ano, voltou a mostrar um mazela da sociedade brasileira. Assim como aconteceu em 2010, quando a candidata do Partido dos Trabalhadores (PT), Dilma Rousseff, foi a mais votada no primeiro turno e venceu na maioria dos estados do Nordeste, foi comum ver manifestações preconceituosas sobre o povo desta bela e importante região do nosso país. Infelizmente, ao que parece nesses quatro anos de intervalo, o preconceito não diminuiu.

É estranho que ainda se escreva lamentando isso, pois é comum ouvirmos que no Brasil não existe preconceitos, mas basta uma rápida caminhada pelas ruas, ou uma olhada nas redes sociais para percebemos que isso é um grande engodo. Em 2010, foram muitos os casos de comentários preconceituosos, tentando justificar o voto dos nordestinos na candidata aos benefícios sociais implantados nesses 12 anos de governo.

Foram "pedidos" de holocausto nordestino, pedido de plebiscito separatista, nos moldes do que aconteceu recentemente na Escócia e em breve na Catalunha, pedindo a divisão do país entre norte e sul, onde o norte "preguiçoso", votaria no PT e o sul trabalhador, teria Aécio Neves e o PSDB no governo, garantindo o progresso e o desenvolvimento econômico. Baseando-se apenas no resultado eleitoral, estes cidadãos acabam por dar "férias" a democracia e deixaram transparecer todo o reacionarismo que garantiu ao país o Congresso Nacional mais Conservador desde 1964, não a toa, o ano do Golpe que sepultou a democracia por 21 anos.

A vasta estupidez dessas pessoas pode ser lida neste site. Além de um festival de preconceitos, os comentários apontam também um festival de ignorância, esquecendo que em estados fora do nordeste como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, a candidata petista saiu vencedora nas urnas. A exposição do lado preconceituoso da sociedade se consolidou com declarações vastas de que quem votou no PT, fez isso por ser "menos instruído", ou por pertencer a classes sociais menos favorecidas.

Até um ex presidente se prestou ao papelão de proferir comentários preconceituosos, ao avaliar o resultado do primeiro turno. O tucano Fernando Henrique Cardoso, o sociólogo afirmou que os "menos informados", são os eleitores do partido da candidata mais votada no primeiro turno.

Outro ponto lamentável desse processo eleitoral, é que boa parte dos eleitores do que se auto nomeou " a nova política" e que não desistiria do Brasil, unido esse país capitaneados pelos melhores de cada grupo que forma nosso país, acabaram tendo papel destacado, neste festival de ignorância, desinformação, ódio e preconceito. Logo eles que tanto falaram em combater os que tentavam dividir o país e que lutavam pela união do Brasil, agora, após a derrota nas urnas se aproveitam da internet e dos espaços públicos para arrancarem suas máscaras de nova política e se mostrar, como o novo que já nasce velho.

Estes eleitores, ao se comportarem dessa forma, demonstram que não entendem e ou não aceitam o jogo democrático e não sabem perder. Se dizem democráticos, mas na prática acabam agindo como os históricos "Déspotas esclarecidos", que maquiavam suas ações com ideias progressistas mas praticavam governos totalitários. Infelizmente essa prática, comum no século XVIII e ao que parece, para muitos brasileiros, ela continua atual