sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Muito barulho por nada

Desde o término do processo eleitoral, um dos assuntos mais debatidos no Brasil é a composição da equipe econômica do novo governo Dilma. Depois de muito falatório e especulação, finalmente foram anunciados Joaquim Levy, para a Fazenda, Nelson Barbosa para o Planejamento e a manutenção de Tombini, no Banco Central.

Assim como aconteceu com o nome cotado para assumir a pasta da Agricultura, a escolha de Levy para a Fazenda, também gerou críticas por parte de militantes tanto do PT, como de alguns movimentos sociais, que alegam que Levy representa um retrocesso, uma vez que o mesmo já atuou no governo FHC e atualmente trabalha em um grande banco brasileiro. Eu discordo dessa posição.

Levy tem um currículo que o credencia para ocupar o cargo e alegar sua participação no governo FHC, não é algo que deveria desaboná-lo, pois Levy continuou trabalhando junto ao governo Federal também durante o período em que Lula governou o país. E por falar em Lula, seu governo mostrou que nomes intimamente ligados ao ideário antagônico ao defendido pelo PT, podem ter atuação destacada nos governos petistas. Henrique Meireles que o diga. Ele também tinha ligações com o PSDB e também trabalhou em um grande banco e nem por isso deixou de fazer um trabalho destacado e alinhado com o Planalto.

Além do exemplo de Henrique Meireles, existem outros nomes que passaram pelos governos Lula e Dilma, que são qualificados para os cargos, que ocuparam e que tem relações com empresas, que simbolizam ideários antagônicos aos petistas. Entre estes nomes podemos citar Thomas Traumann, atual secretário de comunicação da Presidência da República e que tem passagens por veículos como Folha de São Paulo, Veja e Época. Outro profissional da mesma área e com qualificação suficiente para ocupar tal cargo é o jornalista Ricardo Kotscho, que ocupou o mesmo cargo de Traumann, durante o governo Lula. Kotscho trabalhou em veículos como Folha de São Paulo, Estado de São Paulo e Jornal do Brasil, atualmente trabalha na Record. 

Outros exemplos são Helena Chagas e Franklin Martins, que ocuparam o mesmo cargo e tem passagens por jornais como O Globo e Diário de São Paulo. Desta forma, não vejo muito sentido em criticar a escolha de Levy para o Ministério da Fazenda, alegando sua relação com o mercado. Quanto a escolha de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura, tenho muitas críticas a ela e inclusive espero que ela não seja confirmada, mas isso é assunto para um outro texto.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Esqueletos nos armários



É comum ouvirmos a cada vez que se tornam públicos escândalos e histórias escabrosas, em países em desenvolvimento, que isso só acontece no “terceiro mundo*”. Pois bem, alguns relatos tornados públicos esta semana, mas de maneira bem tímida, mostram que países tidos como exemplos corriqueiros de desenvolvimento, cidadania e justiça, também tem seus “esqueletos nos armários” e que os mesmos precisam ser retirados para uma ampla limpeza, dos espaços.

A jornalista e documentarista Dorrit Harazim (1943), nascida na Croácia, então parte da Iugoslávia (1918-2003) mas que tem nacionalidade brasileira publicou um texto no Blog do Noblat, falando de um passado não muito recente e absurdamente desumano, da Suíça, o paraíso dos endinheirados, dos chocolates e dos queijos. O relato conta a história dos verdingkinder (algo como crianças arrendadas). O termo é utilizado para se referir a mais de 300 mil crianças pobres, órfãs, ou ainda consideradas “fardos econômicos”, que eram distribuídas pelo Estado para famílias de agricultores, como mão de obra barata- praticamente escravos -.

Essa prática nefasta teve início em meados do século XIX, e perdurou até 1981. Ainda hoje, a sociedade suíça, tenta organizar um referendo sobre a reparação financeira aos sobreviventes dessa prática. Uma petição pedindo o referendo foi lançada em abril deste ano e já alcançou 100 mil assinaturas. Para que o referendo seja realizado, falta apenas a aprovação do parlamento. Entretanto, o Sindicato dos Agricultores (principal categoria beneficiada pela prática) e o Partido Democrata Liberal (de direita), se opõem a iniciativa e já anunciaram que não irão colaborar com o Fundo para atender os sobreviventes. Tal fundo teria o valor de 500 milhões de Francos Suíços (R$ 1,3 bilhão).

Causa estranheza, saber que um país tão invejado, quando se trata de questões como justiça, educação e trabalho, tenha baseado sua formação econômica na prática escravagista, mesmo depois de tantos anos de a escravidão ter sido “oficialmente” abolida.

É urgente que a Suíça acerte as contas com o seu passado e caso tal retificação não seja feita, é preciso que a Comunidade Internacional, puna através de sanções comerciais e econômicas este pequeno país, no coração da Europa, nos mesmos moldes que já fez com tantos outros países pelo mundo.

* Expressão que caiu em desuso desde o fim da Guerra Fria.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Precisamos falar sobre aborto

Não é de hoje que esse assunto alimenta debates acalorados e polêmicos, mas o aborto precisa ser entendido como uma questão de saúde pública e não de segurança. Não vejo razões plausíveis para se alterar a legislação brasileira, quando a questão é o aborto. Não é nela que reside o núcleo do problema que está diretamente ligado a essa prática.

O aborto precisa ser visto como legal nos casos já previstos em lei e nestes casos, a rede pública de saúde, deveria ser estruturada para garantir que as mulheres que se enquadrarem nos casos estabelecidos pela legislação e que queiram abortar, tenham um tratamento digno e seguro, eliminando os riscos que os abortos ilegais envolvem.

Atualmente, o aborto clandestino é a quarta maior causa de morte materna no país e levantamentos recentes apontam que o número de abortos ilegais, já ultrapassa 1 milhão, o que por si só já demonstra a necessidade de abordar a questão de forma mais clara e objetiva.

Essa realidade demonstra que é preciso ampliar e estruturar a rede pública de saúde para atender os casos, permitidos pela legislação. Atualmente existem apenas 65 unidades de saúde aptas para fazer o aborto em todo o país. É preciso ampliar de maneira exponencial essa rede, garantindo não apenas o acesso ao processo do aborto, mas também todo o acompanhamento social e psicológico que esta situação demanda, mais ou menos como já ocorre no nosso vizinho Uruguai.

Para que essas mudanças ocorram, é preciso que a sociedade se mobilize cobrando do poder público, que esses avanços se consolidem. Somente assim, o país poderá mudar de maneira considerável essa triste realidade que vivemos hoje.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

E por falar em seleção

O futebol tem algumas coisas interessantes. Depois de cerca de quatro meses do pior resultado da história da seleção brasileira, a derrota por 1 a 7 diante da Alemanha, em pleno Mineirão, ainda tem muita gente que recorda do resultado para tentar justificar várias coisas ruins do futebol no Brasil. É evidente que o futebol brasileiro não vive um bom momento e isso é visível não apenas com a seleção, mas também é preciso um olhar mais atento para se fazer uma análise global do futebol e da seleção canarinho.

Amanhã, 18, o Brasil fará seu último jogo em 2014. A adversária será a Áustria e a partida será na casa do adversário e o Brasil tenta manter a sequência de vitórias que se iniciou logo após a Copa do Mundo e que conta com vitórias contra a Colômbia, destaque do mundial no Brasil, vitória sobre a Argentina, atual vice campeã mundial.

Por outro lado, equipes que tiveram destaque durante a Copa deste ano, não vem apresentando um bom futebol atualmente. Basta vermos a situação das Eliminatórias da Eurocopa, para perceber isso. A Holanda, que estreou na Copa massacrando a Espanha, na Fonte Nova e fechou a competição com o 3 a 0 sobre o Brasil, que lhe valeu o terceiro lugar, está em terceiro lugar em seu grupo e mesmo vindo de uma vitória em casa por 6 a 0 contra a fraca Letônia, estaria fora da Euro, caso a fase classificatória terminasse hoje, mesmo estando em um grupo relativamente fácil, que tem apenas República Tcheca e Turquia, que poderiam complicar a vida dos holandeses.

Outro exemplo é a Alemanha, tetra campeã do mundo, que venceu a Copa no Brasil com autoridade e que está em uma chave onde a classificação em primeiro lugar seria obrigação. Entretanto, na classificação atual os alemães estão em segundo, três pontos atrás da vizinha Polônia, que nem na Copa chegou.

Dos gigantes europeus, o único que vem cumprindo seu papel da maneira como era esperado, é a Inglaterra. O "English Team", lidera sua chave com seis pontos de diferença para Eslovênia. Suíça e Lituânia. A seleção da terra da Rainha, é a única grande com 100% de aproveitamento e uma das três seleções a atingir tal feito. As demais são a República Tcheca e Eslováquia. Outra seleção que vem desempenhando um bom papel é a Itália, que divide a liderança com a Croácia, perdendo apenas nos critérios de desempate.

O desempenho das seleções que disputaram o mundial deste ano, mostra que a "gangorra do futebol" está bastante atuante e quem estava em alta durante aquela competição, hoje já não vive um momento tão bom assim e que parecia estar em baixa naquela época, vem se recuperando bem, ainda que as marcas do passado ainda estejam a mostra, parecem já bem cicatrizadas.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Carta Aberta aos golpistas

Desde o fim das eleições deste ano, no dia 26 passado, uma parcela da população inconformada com o resultado apresentado pelas urnas, passou a propagar ideias erradas para, a partir dela, manipular a população e assim tentar alcançar seu principal objetivo que é a tomada de poder.

Foram manifestações pedindo impeachment da atual presidenta, reeleita agora para mais quatro anos e também o apelo a uma intervenção militar. Esses comportamentos servem apenas para apontar duas tristes características da sociedade brasileira contemporânea.

A primeira é a incompreensão do real significado da palavra democracia. De origem grega, a palavra significa poder (kratos) do povo (Demo), regime de governo em que todas as decisões importantes na política, são tomadas pelo povo, que elegem através do voto, seus representantes. Em uma democracia, mais vital do que a alternância de poder, tão cobrada durante a eleição, é o respeito à vontade da maioria e no dia 26 de novembro, a maioria dos brasileiros decidiu pela reeleição de Dilma. Qualquer ação contrária a isso é tentativa de golpe.

A outra, é que mesmo após 25 anos de uma democracia que vem se consolidando, boa parte da população ainda se encanta pela serpente do totalitarismo. Ao pedirem por intervenção militar, mostram que além de desrespeitarem a democracia, também tratam com desdém, a Constituição Federal, ao tentar distorcer a Constituição de 1988, para justificar uma nova intervenção militar, exatos 50 anos depois da primeira.

Segundo o artigo 144 da Constituição de 1988, lei ou ordem, são entendidas como sinônimo de segurança pública. E conforme o inciso 2o do artigo 15 da Lei Complementar no 97, de 1999 “a atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.”

Assim sendo, o DNA golpista fica claramente exposto quando as pessoas vão as ruas ou a internet pedir intervenção militar para tentar anular o resultado da última eleição.

sábado, 1 de novembro de 2014

Flertando com o golpismo

Acabaram as eleições e depois de quatro meses de intensos ataques de parte a parte, as urnas apontaram a vitória de Dilma Rousseff (PT), para mais quatro anos de mandato. Com esse resultado, o Partido dos Trabalhadores, completará 16 anos ininterruptos de governo. Durante a campanha, a oposição falou muita besteira e distorceu diversos fatos para tentar, através do voto, chegar a Presidência, fosse com o Eduardo Campos, que foi substituído pela Marina Silva, ou fosse com o senador Aécio Neves.

Tudo era motivo para tentar justificar a mudança, que estes nomes diziam representar. Alegaram que o país caminhava para uma ditadura, uma vez que a democracia pressupõe alternância de poder e o PT, caso vencesse, como venceu chegaria ao seu quarto mandato seguido. Para estes senhores, lembro que a África do Sul, que deu ao mundo a figura imprescindível de Nelson Mandela, que faleceu este ano, nunca foi uma ditadura, mesmo no período de apartheid, contra o qual Mandela foi o maior opositor. 

Lá, o Congresso Nacional Africano (CNA), após eleger Mandela presidente há 20 anos, jamais perdeu uma eleição presidencial e nem por isso o país se tornou uma ditadura e a alternância de poder sempre foi garantida.

Outro exemplo, mais próximo é o Uruguai, onde não há reeleição, mas no final deste mês, os uruguaios devem reconduzir Tabaré Vazquez, da Frente Amplia (FA), para seu segundo mandato. Entre um e outro, haverá o mandato de José Pepe Mujica, também da Frente Amplia (FA), que se encerra ao final deste ano. Nosso pequeno vizinho já não é uma ditadura faz tempos e lá, assim como na África do Sul e também aqui, a democracia é garantida de todas as formas. 

Não bastasse o argumento raso de necessidade de alternância de poder, os opositores se valeram do jogo sujo de distorcer os fatos para tentar que isso lhes favorecessem, mas não aconteceu. Agora insatisfeitos com mais uma derrota eleitoral, o principal partido oposicionista, se mostra oportunista e tenta a última cartada desesperada de pedir à justiça eleitoral, a recontagem dos votos no segundo turno, mesmo sem apresentar dados concretos que justifiquem a iniciativa.

É estranho que exatamente 50 anos depois de os setores mais reacionários da sociedade brasileira, terem solapado a democracia com o golpe civil militar de 1964, que gerou uma ditadura de 21 anos, esse mesmo grupo tente novamente desmontar o Estado Democrático de Direito, com uma iniciativa tão baixa como essa recontagem. Além de demonstrarem claramente que não sabem conviver com a derrota, apontam também para o flerte com o golpismo. 

Em breve, não me surpreenderei caso escute de alguém desse grupo, declarações como a creditada ao ex-ditador Figueiredo (1918-1999), ao ser questionado sobre a candidatura de Leonel Brizola (1922-2004) para a Presidência, nos anos 80, quando teríamos a primeira eleição após a reabertura democrática: "Se o Brizola se candidatar, não ganha, se ganhar, não toma posse, se tomar posse não governa".

Para estes senhores que se dizem democratas é preciso destacar que em uma democracia, a vontade popular é soberana e ela é demonstrada através das urnas, como aconteceu este ano. Assim sendo, não reconhecer o resultado das urnas, só pode ser classificado como uma atitude antidemocrática, para não dizer golpista.